Famasul reage e repudia plano do governo para regularização de terras indígenas em litígio

Compartilhe:

A proposta de Plano Transitório apresentada pelo governo federal para a regularização de terras indígenas em litígio judicial provocou forte reação da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), que classificou o texto como um “grave prejuízo à classe produtora”. A entidade critica duramente os termos da proposta encaminhada pela União ao Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando que ela ignora o direito de propriedade e estimula novas invasões no campo.

A medida está sendo analisada no âmbito da Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) nº 87 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) nºs 7582, 7583 e 7586. As ações fazem parte da tentativa do STF de mediar uma solução para os conflitos fundiários, por meio de uma comissão de conciliação criada pelo ministro Gilmar Mendes, após meses de impasse em casos envolvendo disputas entre produtores rurais e grupos indígenas.

No entanto, após quase um ano de reuniões e audiências sem consenso, a proposta apresentada pela União desagradou o setor produtivo. Segundo a Famasul, o plano prevê indenizações com valores “ínfimos” apenas pela terra nua — desconsiderando benfeitorias e o valor de mercado real — e cria insegurança jurídica em todo o país, especialmente em estados como Mato Grosso do Sul, onde os conflitos agrários são históricos e crescentes.

Insegurança no campo

Mato Grosso do Sul é um dos estados brasileiros com maior número de áreas em disputa fundiária envolvendo comunidades indígenas. De acordo com dados do Observatório da Famasul, entre 2010 e 2024, foram registradas mais de 130 invasões de propriedades privadas em território sul-mato-grossense. Muitas dessas ocorrências estão ligadas a áreas produtivas, onde famílias rurais há décadas mantêm atividades agropecuárias regulares, com títulos de posse emitidos pelo próprio Estado brasileiro.

Continua depois do anúncio

A indefinição sobre as áreas, somada à suspensão constante de liminares de reintegração de posse, tem provocado prejuízos diretos a centenas de produtores. Em diversas regiões, há propriedades ocupadas há mais de cinco anos, sem que os proprietários possam retomar o uso legítimo de suas terras. A situação impacta a renda, o crédito rural e até a saúde mental das famílias envolvidas.

Famasul cobra indenização justa e defende direito de propriedade

Para a Famasul, a proposta da União representa não apenas um retrocesso, mas um desrespeito aos fundamentos constitucionais da propriedade privada. A entidade sustenta que, se a desapropriação de terras vier a ocorrer, o Estado deve arcar com indenizações justas, baseadas no valor de mercado, conforme já reconhecido pelo próprio Supremo no julgamento do RE 1.017.365/SC, em que o tribunal admitiu a possibilidade de indenização prévia pela terra nua em casos de ocupação tradicional — mas sempre com valor justo.

Continua depois do anúncio

“Não se pode admitir que produtores com títulos legítimos sejam penalizados com valores simbólicos. Isso desestimula a produção, destrói economias locais e ameaça a estabilidade fundiária de todo o país”, reforça a entidade em nota.

Além disso, a Famasul alerta para o risco de a proposta abrir um precedente perigoso: “A ideia de pagamento inferior ao valor de mercado pode servir de estímulo para novas invasões, criando um cenário de completa insegurança jurídica e social no campo”, alerta a federação.

Atuação da Famasul

A Famasul tem atuado ativamente junto ao Supremo Tribunal Federal e ao Congresso Nacional em defesa dos produtores rurais do estado. Entre as ações desenvolvidas estão:

  • Apoio jurídico a produtores com áreas invadidas;
  • Produção de estudos técnicos e jurídicos sobre os impactos das demarcações;
  • Participação ativa na mobilização nacional da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA);
  • Parcerias com associações locais para assistência a famílias em situação de vulnerabilidade por conta dos conflitos fundiários.

A entidade também defende o cumprimento do marco temporal — tese segundo a qual só podem ser demarcadas como terras indígenas aquelas que já estavam ocupadas por povos originários até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.

Enquanto o STF continua a analisar os processos, a tensão no campo se agrava. A proposta do governo, apresentada sem o devido diálogo com os representantes do setor produtivo, elevou a preocupação em estados produtores, onde o agronegócio é a principal base da economia e da geração de empregos.

Por: Henrique Theotônio