
A inadimplência no agronegócio brasileiro voltou a subir, atingindo 7% na Caixa Econômica Federal, o maior índice desde 2018. O cenário levou o banco a reduzir a oferta de crédito ao setor, ampliando as dificuldades de produtores que já enfrentam custos elevados, instabilidade climática e retração no financiamento público e privado.
Segundo o advogado Lando Bottosso, especialista em direito agrário e financeiro, as respostas do governo têm sido insuficientes diante do tamanho da crise.
“Medidas como a renegociação de dívidas apenas postergam os problemas e desviam recursos da atividade produtiva. O país precisa de uma estratégia mais consistente, que envolva ajuste fiscal e redução da taxa Selic, barateando o custo do crédito, sobretudo nos bancos públicos, que concentram parte significativa do financiamento rural”, afirma Bottosso.
O especialista também destaca a importância da securitização do crédito rural, mecanismo que transforma dívidas em ativos financeiros negociáveis.
“Esse caminho permitiria fluxo contínuo de capital para os produtores e daria mais previsibilidade ao setor”, acrescenta.
A preocupação se justifica pelo peso do agronegócio na economia nacional. Dados do IBGE e do Ministério da Agricultura indicam que o setor representa cerca de 25% do PIB brasileiro e responde por quase 50% das exportações do país. Em 2024, o agronegócio movimentou mais de R$ 2,6 trilhões, segundo levantamento do Cepea/Esalq-USP.
“O agronegócio é motor da economia. Mais do que medidas paliativas, precisamos de soluções que assegurem sustentabilidade financeira de longo prazo”, reforça Bottosso.
O aumento da inadimplência afeta principalmente pequenos e médios produtores, que dependem fortemente de programas públicos de financiamento. Sem crédito, esses produtores reduzem investimentos em tecnologia, produtividade e inovação, comprometendo a competitividade do Brasil no cenário internacional.

Em paralelo, a Medida Provisória 1.314/2025, que cria uma linha de crédito emergencial de até R$ 12 bilhões para produtores afetados por eventos climáticos extremos, representa um avanço, mas levanta desafios jurídicos. A análise é do advogado Marco Antônio Ruzene, doutor em direito tributário e sócio do Ruzene Sociedade de Advogados.
Segundo Ruzene, a MP prioriza pequenos e médios produtores por meio do Pronaf e do Pronamp, atendendo a uma demanda urgente do setor. No entanto, alguns pontos sensíveis precisam ser observados na regulamentação pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), como o alcance da renegociação em operações já prorrogadas.
“Será essencial definir os limites para evitar a caracterização de novação irregular ou o comprometimento de garantias já constituídas”, destaca o especialista.
Outro ponto central envolve as Cédulas de Produto Rural (CPRs), amplamente utilizadas no financiamento agrícola. Ruzene alerta que a renegociação dessas dívidas deve preservar garantias e segurança jurídica, evitando fragilizar o interesse dos investidores.
“Sempre que há normas de emergência, surgem debates sobre a compatibilidade com contratos privados e sobre a abrangência dos critérios de enquadramento. A formalização rigorosa dos acordos será essencial para mitigar disputas futuras”, afirma.
O advogado reforça que a segurança jurídica dependerá da clareza das normas operacionais do BNDES e das instituições financeiras, bem como da correta documentação dos contratos.
“O apoio emergencial não pode comprometer a confiança no mercado de crédito rural. É fundamental que a execução da MP seja feita com previsibilidade e equilíbrio econômico-financeiro”, conclui Ruzene.
O debate sobre o crédito rural deve ganhar força nos próximos meses, em meio às discussões sobre orçamento, política agrícola e reforma tributária, exigindo soluções estruturais que garantam equilíbrio fiscal, estabilidade financeira e expansão sustentável do agronegócio brasileiro.
Por: Henrique Theotônio e Amanda Coelho
