O setor de transporte marítimo é responsável por cerca de 80% do volume de cargas comercializado no planeta, segundo informações da Organização das Nações Unidas (ONU). No Brasil, essa porcentagem sobe para 95%, refletindo a dependência do país em relação ao transporte aquático. Essa realidade torna o Brasil especialmente vulnerável às novas regulamentações impostas pela IMO (Organização Marítima Internacional), que prevê a zeragem das emissões de gases de efeito estufa do setor até 2050, além de reduções já previstas de 40% até 2030 e 70% até 2040.
Durante um recente debate da Comissão de Infraestrutura (CI), no Senado, sobre a descarbonização do transporte marítimo, Bruna Roncel de Oliveira, representante do Ministério de Portos e Aeroportos, destacou que, embora o Brasil já esteja incorporando o transporte marítimo em diversas agendas de redução de emissões, como o Plano Clima, a falta de uma política nacional integrada e coesa para a transição energética do setor ainda é uma preocupação premente. “São diversas iniciativas esparsas e ainda a gente não tem reunida, integrada, uma única proposta de política nacional de transição energética ou de descarbonização para o transporte marítimo”, afirmou Roncel de Oliveira, ressaltando a urgência da situação dada a proximidade das imposições regulatórias.
Flavio Haruo Mathuiy, membro da Comissão Coordenadora para Assuntos da IMO, reforçou a importância de um plano nacional que combine uma visão sistêmica com foco na integração de soluções. Ele destacou que a escolha dos combustíveis a serem adotados deve levar em conta critérios de sustentabilidade certificados pela organização internacional. “Não é qualquer biocombustível que será aceito; ele precisa atender critérios rigorosos”, disse Mathuiy, sublinhando a prioridade de uma regulação adequada para a implementação eficaz desse plano.
José Nilton de Souza Vieira, do Ministério de Minas e Energia, introduziu um ponto interessante ao sugerir que as experiências do Renovabio — um programa brasileiro destinado à expansão dos biocombustíveis na matriz energética — possam ser aproveitadas no processo de descarbonização do transporte marítimo. Segundo Vieira, “podemos utilizar com mais tranquilidade na navegação interna, mas queremos demonstrar internacionalmente que os biocombustíveis podem ser produzidos de forma sustentável”, enfatizando a posição do Brasil na sensibilização de outros países sobre o potencial dos biocombustíveis nessa transição.
O senador Espiridião Amin, do Progressistas de Santa Catarina, salientou que a questão dos combustíveis é apenas uma parte de um complexo que envolve todo o ciclo do transporte marítimo internacional. “O combustível é uma parte deste todo, que deve compreender a cadeia completa, abrangendo, portanto, todo o ciclo integrado pelo transporte marítimo internacional”, disse o senador.
Além das discussões sobre combustíveis, Jesualdo Silva, da Associação Brasileira dos Terminais Portuários, destacou a necessidade de também focar nas operações terrestres e portuárias no processo de descarbonização. Segundo ele, “ações precisam ser realizadas também em terra, nos portos, incluindo medidas técnicas e operacionais na operação dos navios e a adoção de novas tecnologias digitais.”
O cenário atual do transporte marítimo no Brasil, portanto, reflete não apenas uma necessidade urgente de adequação às novas normas de descarbonização, mas também um esforço conjunto para desenvolver uma política nacional que seja eficaz e sustentável. O desafio é grande, mas as oportunidades para um futuro mais limpo e responsável no transporte marítimo são ainda maiores.