
Apesar do discurso otimista do governo federal, o Plano Safra 2025/2026, anunciado nesta terça-feira (1º), está longe de ser o alívio que o agronegócio brasileiro esperava. O volume recorde de R$ 516,2 bilhões para a agricultura empresarial – somando-se a outros R$ 78,2 bilhões para a agricultura familiar – revela um crescimento apenas nominal, insuficiente diante da inflação acumulada e do aumento nas taxas de juros.
Na prática, o montante total cresceu apenas 1,5% em relação ao ciclo anterior. No entanto, segundo cálculos da Famasul, apenas para recompor o poder de compra perdido pela inflação de 4,73% em 2024, o valor destinado à agricultura empresarial deveria ser de, no mínimo, R$ 532,65 bilhões. Ou seja: o plano perdeu força antes mesmo de começar.
“O resultado é um plano que aparenta crescimento, mas que não garante, de fato, maior força financeira para quem está no campo”, afirmou em nota a Famasul. “O setor precisa de mais que números inflados: precisa de políticas que cheguem na ponta e assegurem a produção.”
Juros em alta: o crédito mais caro dos últimos anos
Além da defasagem real nos valores, o novo plano penaliza os produtores com as maiores taxas de juros da última década. A linha de custeio para médios produtores (Pronamp) saltou para 10% ao ano, enquanto os demais produtores enfrentarão taxas de até 14%. No ano passado, essas taxas variavam entre 7% e 12%.
A elevação contraria o cenário desejado por entidades como a Aprosoja Brasil, que já vinham alertando para a dificuldade de acesso ao crédito em meio à queda das margens de lucro na produção de grãos. “É insustentável manter a atividade com custo financeiro em dois dígitos e sem previsibilidade de crédito”, afirmou o presidente da Aprosoja Brasil, Fernando Cadore.
Inflação come o crédito: quatro anos de perda de poder de compra
Nos últimos quatro anos, o Plano Safra subiu apenas 26% em termos nominais, enquanto a inflação acumulada no mesmo período (IPCA) ultrapassa 27%. Ou seja, o volume liberado para financiamento rural não acompanha a escalada de preços dos insumos, combustíveis, equipamentos e máquinas agrícolas.
| Ano-safra | Valor Plano Safra Empresarial | IPCA (%) | Juros Cust. Máx. | Poder de Compra (base 21/22) |
|---|---|---|---|---|
| 2021/22 | R$ 251 bi | 10,06 | 7,0% | 100% |
| 2022/23 | R$ 340 bi | 5,79 | 8,5% | 103% |
| 2023/24 | R$ 435 bi | 4,62 | 10,5% | 105% |
| 2024/25 | R$ 508 bi | 4,61 | 12,0% | 106% |
| 2025/26 | R$ 516 bi | 4,73 | 14,0% | 102% (estimado) |
Fonte: Elaborado com base em dados do MAPA, IBGE e SRB
Com isso, mesmo com um valor maior, os produtores compram menos. E o mais grave: os recursos de investimento sofreram recuo de 5,4% em relação à safra passada. Isso significa menos incentivo à modernização, à compra de maquinário e à inovação tecnológica no campo.

Medidas sustentáveis, mas insuficientes
O governo federal tentou suavizar as críticas ao incluir mecanismos de incentivo à produção sustentável. Agricultores que adotarem práticas ambientais terão acesso a juros levemente reduzidos (0,5 p.p.), e novas linhas passam a financiar ações como reflorestamento, culturas de cobertura e aquisição de caminhões-pipa para combate a incêndios.
Contudo, o presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Sérgio Bortolozzo, aponta que os estímulos são limitados diante da conjuntura: “O Plano não atendeu o setor. Aumentou pouco, os juros são elevados e o seguro rural foi simplesmente ignorado. Isso amplia os riscos e afasta o investimento.”
Seguro rural fora da pauta
Um dos temas mais sensíveis para os produtores, o seguro rural foi deixado de lado no anúncio do plano. Nem mesmo o montante destinado ao Programa de Seguro Rural (PSR) foi divulgado, fato criticado por todas as entidades ligadas ao agro.
“Sem seguro, o produtor está vulnerável às perdas climáticas. O governo mais uma vez falha ao não priorizar uma ferramenta essencial para a segurança produtiva do país”, afirmou o deputado Pedro Lupion (PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
A herança do plano anterior e a desconfiança renovada
Vale lembrar que, ao fim do Plano Safra 2024/25, o governo contingenciou parte dos recursos prometidos, frustrando produtores que já haviam planejado o ciclo com base na expectativa de crédito. A medida minou a confiança do setor e reforçou o alerta: não basta anunciar valores, é preciso garantir a execução.
Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o anúncio de um plano safra bilionário sem previsibilidade de liberação dos recursos representa mais um fator de insegurança para o setor. “É preciso que o crédito chegue com agilidade, juros justos e segurança jurídica. Nenhum desses elementos está garantido neste momento”, informou a CNA.
Por: Henrique Theotônio
