Crise no leite afeta produtores de Mato Grosso do Sul, que enfrentam custos altos e importações crescentes

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O setor leiteiro de Mato Grosso do Sul enfrenta um dos períodos mais desafiadores da última década. A queda no preço pago ao produtor, o aumento das importações de leite em pó e queijo e a retração do consumo interno compõem um cenário de forte pressão sobre a rentabilidade das propriedades, especialmente as familiares, que dominam a produção no estado.

De acordo com dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq-USP), o preço médio do litro de leite pago ao produtor sul-mato-grossense caiu de R$ 2,38 em julho para R$ 2,04 em setembro de 2025, o menor valor real desde 2020. O montante não cobre os custos de produção, que, segundo levantamento da Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de MS), giram em torno de R$ 2,60 por litro, considerando alimentação, energia elétrica e mão de obra.

“Há propriedades que estão operando no vermelho há mais de seis meses. A conta não fecha, e muitos produtores estão diminuindo o rebanho ou desistindo da atividade”, afirma Marcelo Bertoni, presidente da Famasul. Ele reforça que o problema se agrava com a entrada de produtos importados, que chegam ao mercado interno a preços inferiores ao custo nacional de produção. “É uma concorrência desleal. O governo precisa agir para proteger o produtor brasileiro”, completa.

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Importações em alta pressionam o mercado

Dados do Comex Stat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, mostram que as importações de leite em pó cresceram 36% entre janeiro e setembro de 2025 em comparação com o mesmo período do ano passado. O principal fornecedor continua sendo o Uruguai, seguido da Argentina, ambos membros do Mercosul.

Esse aumento pressiona diretamente a indústria nacional, que encontra produtos estrangeiros mais baratos, reduzindo a demanda pelo leite cru produzido internamente. Segundo a Nota Técnica nº 21/2025 da FAEP, a situação é semelhante em outros estados do Sul, onde os valores pagos aos produtores ficaram abaixo de R$ 2,00 por litro em alguns meses.

Cenário regional e impacto na economia

Em Mato Grosso do Sul, o IBGE aponta que o estado produziu cerca de 330 milhões de litros de leite em 2024, com destaque para os municípios de Sidrolândia, Caarapó, Terenos e Dourados. A atividade tem forte peso na agricultura familiar: cerca de 75% das propriedades leiteiras são pequenas e utilizam a produção como principal fonte de renda.

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Segundo o Sistema Famasul, o leite representa mais de R$ 600 milhões em Valor Bruto da Produção (VBP) estadual, mas o número deve recuar em 2025 diante da desvalorização do produto e da alta dos insumos, como milho e farelo de soja.

Produtores pedem medidas emergenciais

Entidades do setor defendem que o governo federal retome as investigações antidumping sobre o leite em pó importado do Mercosul e fortaleça mecanismos de aquisição e estocagem pública do produto nacional, a fim de equilibrar o mercado.

“A cadeia produtiva do leite é essencial para o interior do estado. Se o pequeno produtor perde renda, o comércio rural sente, o transporte sente e a economia local desacelera”, explica Ademar Silva Júnior, presidente do Conselho Administrativo do Senar/MS. “É urgente que o governo adote medidas estruturais para garantir previsibilidade e renda mínima ao produtor.”

Contexto nacional
O Brasil deve fechar 2025 com queda de 5% na captação de leite em comparação ao ano anterior, segundo o Cepea. Em contrapartida, as importações podem ultrapassar 1,6 bilhão de litros equivalentes, o maior volume desde 2018.

A tendência, segundo analistas, é de recuperação lenta, com possibilidade de melhora apenas no primeiro trimestre de 2026, caso o consumo interno volte a crescer e o câmbio favoreça a competitividade do produto nacional.

Por: Amanda Coelho e Adriana Acosta